Em maio lançamos uma chamada para pessoas interessadas em participar de um grupo de estudos sobre temas de tecnologia, gênero e raça. 

As noções de que a tecnologia não é neutra e de que precisamos achar caminhos mais inclusivos e democráticos para pensar/fazer tecnologias sempre esteve presente no minas programam. Mas ao longo dos últimos meses, a vontade de conversar mais profundamente sobre como as tecnologias digitais influenciam e interagem com as diferentes estruturas de opressão presentes nas nossas vidas culminou na criação desse grupo de estudos. 

O grupo de estudos, que começou de uma combinação de curiosidades e interesses das integrantes do minas programam, contou com a participação de cerca de 20 mulheres de cinco estados. Por cinco semanas, discutimos temas como: as relações entre gênero tecnologia, desigualdade e acesso a tecnologias digitais, racismo na tecnologia e as alternativas para a construção de um mundo digital que queremos. 

Como montamos esse grupo de estudos?

No contexto em que estamos vivendo, a nossa primeira opção de realizar encontros presenciais se tornou obviamente inviável. Foi aí que decidimos montar um espaço de formação e troca virtual. Um espaço onde pudéssemos compartilhar ideias, textos, vídeos, podcasts, e arte que tocassem de alguma forma nos muitos temas que estavam pipocando nas nossas cabeças.

O primeiro passo foi definir o que queríamos daquele espaço. para nós, era importante criar um ambiente onde meninas, mulheres e/ou pessoas trans e não binárias que tivessem interesse nos temas pudessem participar, sem necessidade de conhecimento prévio. A ideia é que o grupo fosse um espaço para conversar sobre esses temas de forma flexível e acessível para todas que quiserem. Pensamos também que seria muito interessante juntar pessoas com repertórios pessoais, acadêmicos e profissionais bem diferentes, uma forma de observar os temas a serem discutidos por outras lentes.,

Depois de selecionar pessoas interessadas, foi a hora de rascunhar um código de condutas e estabelecer acordos de comunicação. Queríamos realizar encontros que não fossem exaustivos e tentamos priorizar o bem estar das participantes. Nosso código de conduta visava garantir que a nossa convivência fosse produtiva e respeitosa das nossas diferentes vivências e saberes. 

Em seguida, selecionamos materiais que achávamos relevantes. Como toda curadoria, essa seleção foi um pouco arbitrária, a partir de coisas que já tínhamos lido ou ouvido (e coisas que ainda queríamos muito ler e ouvir). Ao longo das semanas, fomos publicando a seleção completa de materiais que usamos aqui, para qualquer pessoa interessada poder acessar.

Algumas reflexões que queremos compartilhar

Tá mais do que na hora de expandirmos aquilo que enxergamos como tecnologia. Como disseram Bianca Santana (no Podcast Meteora) e Thiane Neves Barros (em artigo neste livro), pessoas negras vêm criando (e hackeando e reimaginando) tecnologias desde sempre. Precisamos voltar a nos inspirar nessas práticas.

Temos que ser mais criativas com os métodos que usamos para transmitir nosso conhecimento. Com reflexões estimuladas por materiais como o relatório Domésticas Conectadas (InternetLab) e pelo conceito de data healing de Neema Githere, fomos lembradas da importância de questionar a forma como produzimos e compartilhamos conhecimento sobre tecnologias digitais. Além disso, constatamos como é importante diversificarmos os formatos de nossas “leituras”, para além dos livros e artigos acadêmicos, existe muito conhecimento sendo trocado através de vídeos e podcasts. 

Tecnologias digitais têm sido usadas como ferramentas da supremacia branca. Como bem demonstram pessoas como Ruha Benjamin, Simone Browne, Tarcízio Silva e outras pessoas que lemos/ouvimos e assistimos ao longo do grupo de estudos, as tecnologias digitais têm sido mais e mais usadas para perpetuar o racismo.

Por último, fica o lembrete de que precisamos imaginar os mundos que queremos. Guiadas por conceitos articulados por pessoas como Sasha Costanza-Chock, uma questão que discutimos em quase todos os encontros é como as tecnologias digitais podem ser usadas para fins emancipatórios. Mais do que um espaço em que aprendemos sobre temas novos, o grupo de estudos foi um espaço para imaginar novas possibilidades para nossos usos de tecnologias digitais. 

Ao final do nosso último encontro, uma participante incrível questionou: “o que faríamos se fôssemos começar amanhã?”. Essa provocação nos lembra da urgência de imaginar novos caminhos. Esse grupo de estudos é apenas mais um começo, mais uma ideia. Se você que está lendo ficou com vontade de criar um espaço para aprender e reimaginar nossas relações com tecnologias digitais e acha que a gente pode ajudar, é só entrar em contato 🙂