
Tabita Barbosa Pereira
Geógrafa e Engenheira de Software
Ex-aluna e atual professora do curso Minas Programam.
Olá! Esse é meu primeiro texto publicado por aqui. Sou professora, desenvolvedora e geógrafa – e mestra em palavras cruzadas. No Minas Programam fui aluna em 2019, monitora em 2021 e 2022, e professora nos anos seguintes, dando aulas de versionamento de código, de desenvolvimento e acompanhamento de projetos e deploy.
Essa é uma tentativa de falar um pouco sobre como a educação transformou, e transforma, minha vida. Sobre como fui capaz de ajudar minha família e a mim mesma através das portas que a educação abriu. Especificamente falarei do processo que me levou a tecnologia, um caminho um pouco incomum.
Eu estudei em escolas municipais e estaduais até a 8ª série. Em Guarulhos, nos anos que fiz o fundamental I, havia uma gestão bem interessante no que diz respeito a estrutura e remuneração dos profissionais de educação. Entre 2003 e 2007, eu acho, eu tive aulas de teatro, capoeira, dança e diversas atividades externas durante esse período. Fomos à Sala São Paulo e lembro até hoje a sensação única de estar naquele lugar gigante e tão bonito. Foi nesta escola que tive acesso aos primeiros livros e a uma biblioteca pessoal das minhas professoras (um abraço especial às professoras Eugenia e Marleusa!).
No ensino fundamental II, pude estar em uma escola localizada em uma área mais central da cidade, onde circulavam informações de outras vivências sociais e de outras oportunidades educacionais. Enquanto estava lá, fiz o famoso curso da Megabyte da época, um curso quase de “introdução à informática”. Nessa escola também havia muito o que se fazer, como aulas de ginastica artísticas, de onde muitas saíram para o “thomeuzão” e dali, para o mundo. Em casa, sempre houve muito incentivo e expectativa que eu e minha irmã fizemos faculdade, isso realmente era imprescindível: não forçaram nossas escolhas de curso, apenas a ideia de que faculdade era algo que deveria ser feito.
A educação foi, e é, uma porta de saída de certos ambientes, padrões e situações perigosas. A educação de fato liberta, não por si só, mas porque ela toca espaços e bagunça certezas, te permite ver mundos antes não pensados, seja na aula, seja na conversa no corredor com seus colegas, seja no evento, na festa, no bar.
Através da minha irmã, que já estava em uma universidade, cheguei à ETEC, e nela, através da divulgação dos próprios professores, conheci o cursinho pré-vestibular Arcadas, da Faculdade de Direito da USP. Fui aluna deles durante meu terceiro ano do ensino médio. As aulas aconteciam durante as tardes, todos os dias da semana, uma rotina que era bem desgastante, dado eu morava bem longe, em Guarulhos. Gastava, em média, 4h/5h por dia no transporte público. Essa foi uma realidade durante pelo menos dois anos do ensino médio, trabalhei entre os 15/16 anos, fiz um semestre de um curso técnico de química e depois entrei, aos 17 anos, no cursinho pré-vestibular.
Quando meus pais entenderam que estudar em uma escola pública mais “central” traria outras oportunidades, eles estavam corretos. Isso custou confiarem que eu estaria a salvo em um trajeto do bairro Vila União ao Macedo, em uma van comum, não escolar, a partir dos meus 11 anos. Eles acreditaram, e precisavam acreditar, porque era isso ou talvez me colocar em espaços onde o que era oferecido era menos do que eu merecia e menos do que eles queriam me dar.
No meu ano de vestibular, 2014, eu acabei perdendo o ENEM, o exame mais importante do ano e mais interessante em termos do que eu queria. Estava indecisa sobre seguir algum curso como Jornalismo ou Comunicação ou ir para a Geografia, que foi a opção final. A principal via de conexão entre vários bairros com o centro de Guarulhos estava travada e eu estava em cima da hora. Foi bem cruel perceber que um ano de estudos tinha ido para o espaço (estudo não se perde, mas foi o sentimento), foi muito frustrante. Ainda assim, naquele ano prestei o vestibular da USP e UNICAMP. Tinha muito desejo de ir pra UNICAMP, porque àquela altura eu já tinha curiado o suficiente para saber sobre permanência estudantil e a UNICAMP, felizmente, é uma das referências nisso, apesar dos seus problemas.
Passei na primeira chamada e lembro até hoje do dia. Era uma manhã de início de ano quente, minha mãe passava roupa no quarto que eu dividia com minha irmã e eu estava sentada na minha cama olhando a lista, meu pai estava na sala de casa assistindo TV. E eu li meu nome, e foi tão especial saber que eu tinha conseguido aquilo, que nós, que nossa família iria mandar mais uma para universidade, e dessa vez para uma pública.
Na Geografia da UNICAMP me formei enquanto pessoa política, enquanto educadora, geógrafa e enquanto uma mulher corajosa. A universidade me permitiu descobrir grupos políticos diversos, formas de pensar e se organizar, pessoas que se permitem experimentar a juventude e a vida, pude aprender sobre mim e sobre o mundo.
Lá tive meu primeiro contato com programação em duas oficinas, uma sobre Arduino e outra sobre Python. A realidade é que na época meu computador era uma carroça e travou na oficina de Python, e na de Arduino fui com um colega que codou e eu montei algumas coisas na protoboard. Ou seja, não tive contato com código exatamente. Mas assim foram abertas portas, e eu busquei outras iniciativas com curso de programação gratuitos para mulheres.
Assim conheci o Minas Programam, numa busca no google ou facebook. Sendo curiosa. Fiz parte da turma de introdução à programação, ainda no modelo presencial em 2019 no espaço Tide Setúbal na ZL. Foi muito importante começar de fato com esse pé direito. A gente tinha alimentação oferecida nos intervalos, havia suporte financeiro para o deslocamento até o curso, havia uma conexão entre aquilo que a gente precisava e o Minas Programam ofereceu de muitas formas. Poder conversar com outras mulheres, com as professoras, ver pessoalmente pessoas que aquele curso poderia mudar e incentivar a novos rumos, foi bastante animador e encorajador.
Após o Minas Programam, fiz um curso na reprograma, no qual eu fui aprovada na segunda tentativa, já que em 2019 me inscrevi, mas não fui selecionada. E, em seguida, fiz um outro curso indicado pelo Minas Programam em desenvolvimento iOS, o que me garantiu de vez minha vaga fixa que ocupo hoje como desenvolvedora. No final de 2020, eu estava desempregada, finalizando a universidade e em busca do meu primeiro emprego como desenvolvedora, a reprograma fez a indicação de algumas meninas a um banco que nos chamou para uma turma de formação em Java – meus cursos até então eram em frontend – e eu aceitei. Desafio remunerado? Topamos! Assim, uma turma com cerca de 40 pessoas, que haviam saído de diversos cursos de programação como Generation e reprograma fizeram o curso e após isso fomos chamados para entrevistas em vagas abertas na época. Não eram vagas exclusivamente para back-end, e eu acabei em uma entrevista para uma posição de junior em desenvolvimento iOS. Eu havia acabado de fazer o curso indicado pelo Minas Programam, gratuito porque tinha uma bolsa para o minas. Ou seja, atenção à sua rede de contatos e indicações!
Hoje, após 7 anos após o primeiro curso para iniciar a transição de carreira, eu posso dizer que sou feliz e orgulhosa pelo caminho que passei. Acredito que iniciar a jornada entendendo o que o Minas Programam propõe de discussão, não só sobre o código, mas sobre sociedade e o impacto da nossa profissão, foi importante para que eu desenhasse uma carreira que faça sentido com o que amo e quero, com a possibilidade de ser uma tecnologista múltipla, que pode fazer uma intersecção das suas carreiras.
É necessário estar disposta: disposta a segurar sua própria mão na jornada de aprendizagem, de descoberta, de sonhos. Nenhum processo de aprendizagem é simples, mas nossos sonhos e desejos valem a pena toda tentativa!