Historicamente no nosso país, o acesso ao ensino superior é um direito que poucas pessoas conseguem acessar. Há pouco tempo que o perfil dos estudantes das universidades públicas está sendo alterado pelas políticas de ingresso, como as cotas. No entanto, outras barreiras ainda dificultam a entrada dos jovens na universidade, como a perda de conexão com a escola no ensino médio, a necessidade de trabalhar e até a falta de confiança no estudo como forma de ascensão pessoal e social.

De acordo com um estudo da UNICEF, 10% dos estudantes desistiram da escola durante a pandemia, e o principal motivo para interrupção dos estudos foi a necessidade de trabalhar, para 48% desses estudantes.

Para muitos estudantes de escolas públicas, especialmente para quem não tem pais e parentes próximos que fizeram faculdade, entender o processo para entrar na faculdade pode ser bastante complicado. Muitas escolas não oferecem informações e apoio institucional para que esses estudantes planejem essa próxima etapa da vida e assim, faltam referências para que adolescentes saibam o caminho para avançar nos estudos.

Para ilustrar essa questão, podemos observar o ENEM, o exame que é considerado a principal porta de entrada nas universidades federais, e que chegou a ter 8,7 milhões de inscritos em 2014. Em 2021 foram 3,1 milhões de inscritos no ENEM, e 3,4 milhões em 2022, os dois menores totais em 17 anos do exame. Em 2023 foi observado um aumento de quase 10% em relação a 2022, mas mesmo com esse aumento, quase metade dos jovens concluintes do ensino médio não fizeram a prova.

No Jornal da Unesp, a professora Debora Jeffrey, que é líder do Grupo de Estudos e Pesquisas em Política e Avaliação Educacional na Unicamp, pontua que

“Não é possível dizer que há um desinteresse dos jovens pelo ensino superior, mas sim que a situação econômica do país, a falta de políticas de educação e o incentivo ao empreendedorismo, em detrimento de uma política de educação superior, colaboraram diretamente para a procura dos jovens por essa etapa do ensino.”
Debora Jeffrey 

A pesquisa “Juventudes fora da escola”, realizada pela Fundação Roberto Marinho e o Itaú Educação e Trabalho, em colaboração técnica com o Instituto Datafolha, focou nos jovens de 15 a 29 que não concluíram o ensino básico no Brasil e constatou que 73% deles pretendem voltar aos estudos.

Entre os que não pretendem concluir o ensino médio, o principal motivo é a necessidade de trabalhar. Na época da pesquisa, esses jovens que não concluíram o ensino básico estavam há 6 anos sem estudar e 68% já tinha repetido de ano. Para essas pessoas, voltar para a escola é ainda mais difícil.
De acordo com Rosalina Soares, assessora de pesquisa e avaliação da Fundação Roberto Marinho,

“A gente está falando de um estudante que trabalha e de um trabalhador que precisa estudar. A gente precisa refletir sobre o cuidado com a família. As questões de gênero impactam neste retorno à escola”.
Rosalina Soares

Após um tempo longe da escola, pode ser mais difícil se engajar para a conclusão do ensino médio e depois, na busca por um diploma em nível superior. A escola já não é mais tão atraente como poderia ser na adolescência, o tempo disponível para estudos é escasso e as oportunidades para estudo online não promovem o acompanhamento da aprendizagem como esses jovens necessitam para avançar mais rapidamente essa etapa de formação.

“Fica implícito para esse jovem que é difícil compatibilizar trabalho e estudo. Mas percebemos também na pesquisa que tem um desencantamento pelo trajeto escolar. Eles estão desanimados pelas experiências que já tiveram.”
Rosalina Soares

No entanto, as principais motivações para terminar os estudos entre esses jovens são:sção ter um emprego melhor (37%) ou arrumar um emprego (15%), e cursar uma faculdade (28%).

“O que realmente os alunos pensam sobre o ensino superior” é outra pesquisa sobre as motivações para o ingresso no ensino superior, que foi realizada em 2024 pelo Semesp, entidade que representa mantenedoras de ensino superior do Brasil. Essa pesquisa mostrou que 80% dos participantes da pesquisa pretendia ingressar em uma instituição de ensino superior em 2025. A principal motivação desses jovens é conseguir um emprego na área de trabalho desejada.

Essas pesquisas demonstram que jovens que já experimentaram estar no mercado de trabalho, ainda que de maneira informal, consideram ser importante ter uma especialização em sua formação para ter oportunidades melhores de trabalho.

Em 2025 o Instituto Minas Programam promove o programa daqui pra frente >>, com o objetivo de mapear os caminhos até o ensino superior para meninas e mulheres negras, indígenas e periféricas no Brasil.


Este texto é o segundo de uma série de 4 publicações que apresentarão os detalhes desse nosso novo programa. Primeiramente, falamos como a pandemia de COVID-19 trouxe novos desafios para as estudantes negras e periféricas no ensino básico. [ Leia aqui. ]

 

No próximo texto da série, vamos refletir se vale a pena mesmo fazer faculdade.

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